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Brisa Flow lança o clipe de “De dentro dos seus olhos” com imagens exclusivas gestando seu segundo filho

A artista propõe uma discussão sobre o processo de gerar vida e maternar no mercado…

A artista propõe uma discussão sobre o processo de gerar vida e maternar no mercado da música

No dia 21 de março, a cantora, compositora e artista multimídia Brisa Flow lança o clipe de “De Dentro Dos Seus Olhos”, faixa de Janequeo (2022), seu último álbum. Filmado em Picinguaba (Ubatuba/SP), com criação e direção da própria Brisa ao lado da Espelho Lunar Cine, é uma celebração à maternidade e um afronte ao machismo.

“A maternidade é uma das coisas mais desafiadoras da minha vida. Gestar, nutrir, criar são processos que envolvem dedicação, amor e muita criatividade. Mas infelizmente, como na maioria das profissões, se você é artista e mãe, com certeza vai passar situações machistas no trabalho, na rua e muitas até na própria família”, expõe Brisa.

Ela acaba de dar à luz ao seu segundo filho e manteve a gestação com discrição por considerar um momento muito íntimo e particular. Ainda estava em turnê do disco Janaqueo e precisava lidar com suas emoções. “Tomei a decisão de ser reservada quando assisti dois vídeos: um sobre o figurino da Erykah Badu, onde ela lembra que, para não perder os trampos, não contou que estava grávida de uma de suas filhas; o outro, de um cara falando sobre a turnê da Lauryn no Brasil. Ele foi péssimo ao dizer que na turnê deram várias coisas erradas, começando pelo fato de ela estar grávida. Pensei que abordariam o tema, mas na verdade eram problemas técnicos que poderiam ter acontecido com qualquer artista, não tinha nada a ver com a gravidez. A partir daí, decidi manter minha gestação o mais privada possível, o que não me livrou de comentários desnecessários”.

Brisa lembra que o que mais gostava de fazer para relaxar, enquanto lidava com suas emoções, era cantar e que as pessoas tentavam convencê-la de que não podia. Conta que cuida da alimentação, faz hidroginástica, pilates e que, mesmo assim, era questionada o tempo todo sobre o que iria fazer quando tivesse outro filho.

“A sociedade está sempre pronta para julgar uma mãe, mas nunca pronta para acolhê-la. Vemos isso nos espaços que não temos pra crianças e mães. Vemos isso no próprio sistema de saúde do Brasil, seja particular ou público, onde o bem estar do bebê e da mulher muitas vezes não são respeitados. Sem falar no racismo que nós, mulheres indígenas e pretas, passamos para poder ter nossos filhos. Desde o pré-natal até o parto e a amamentação. É luta atrás de luta. E ainda nos tiram a oportunidade de continuar trabalhando, pois as mães são as menos contratadas e recebem mal. Muitas vezes somos tiradas de loucas quando as emoções transbordam e não damos conta de segurar a pressão”.

A ideia de filmar o clipe durante a gestação vem da exaustão provocada pelas violências sofridas pelas mães durante todo o processo. “Foi uma forma de transmutar em arte para não esquecermos do quão especial, lindo e único pode ser esse momento para nós. Mulheres indígenas estão lutando contra um genocidio e um epistemicídio dos nossos saberes ancestrais há gerações . Estamos lidando com a morte e o suicídio de nossos jovens (o maior na estatística da juventude brasileira). Fica muito difícil nos dar Newen força todos os dias pra lembrar que somos vida e bem viver, a raiz da nossa Terra Fértil”, orgulha-se. “A nossa sociedade precisa aprender a respeitar, estar ao lado de quem gesta , amamenta, nutre e cria. É preciso que entendam que esse nosso processo é sagrado, para que possamos ter parcerias na criação desses curumins, novos seres que são o nosso futuro. E o mercado da música precisa entender isso na prática, contratando e pagando melhores essas pessoas porque, afinal, somos muites e somos excelentes entregando discos e trabalhos incríveis e férteis, assim como nossa criatividade para podermos criar nossas crianças no meio disso tudo”.

Saiba mais sobbre BRISA FLOW:

A artista Brisa Flow constrói sons e imagens a partir da vivência de seu corpo no mundo e cria caminhos que desprendem das amarras da colonialidade. Desenvolve estéticas artísticas pela prática e pesquisa do canto, tecendo memórias e nativas narrativas através do rap, instalações e videoarte. Brisa de la Cordillera recebeu esse nome de seus pais, artesãos caminantes. Para muitos povos dos Andes, o canto vem do vento. A cantora, licenciada em Música pela Fiam Faam, pesquisa e defende a arte dos povos originários e o rap como ferramentas necessárias para combater o epistemicídio. Newen, seu álbum de estreia, foi lançado em 2016 e significa “força”, em Mapuzgundun (língua nativa do povo Mapuche). A obra musical esteve entre os 20 melhores discos do ano selecionados pelo jornal Estadão. Em 2017, foi a artista aposta da Folha de São Paulo e recebeu o prêmio “Olga Mulheres Inspiradoras”. O segundo disco, Selvagem Como o Vento, foi lançado em 2018 no Instituto Tomie Ohtake e destacou-se em listas de 50 melhores discos da música brasileira nos sites da Red Bull, Genius e outros canais de música. Em 2020, lançou de forma experimental o EP Free Abya Yala, um trabalho de improvisação jazzrap. O título significa “América Livre” ou “Terra Fértil Livre”, sendo Abya Yala (no idioma do povo Kuna) o nome que vem sendo utilizado por artistas indígenas para referir-se ao continente americano. As músicas foram produzidas em colaboração com um quarteto de jazz e inspiradas nas pesquisas de Brisa Flow sobre freestyle e música originária. O EP foi premiado e recebeu elogios pela crítica musical como um trabalho anti colonial experimental. Em junho de 2022, lançou seu terceiro álbum, Janequeo, inspirado na narrativa dessa guerreira do povo originário Mapuche que liderou quatro mil homens na Guerra de Arauco para libertar Wallmapu do genocídio e vingar a morte de seu marido e lonco, Huepotaén. Em 2023, foi a primeira artista indígena a se apresentar no Lollapalooza Brasil.

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