Periferia 360º deu vida à Brasília no último fim de semana

“A periferias sob um céu de 360º“, acredito que essa frase escolhida pelos organizadores para…

A periferias sob um céu de 360º“, acredito que essa frase escolhida pelos organizadores para representar o festival Periferia 360º era uma referência à sequência de vários outros eventos que aconteceram em diversas partes do DF e, culminou na grande festa nos dias 12 e 13 no Museu da República. Entretanto, há mais um grandioso significado nessa frase: O céu.

O céu de Brasília é icônico, aparece sempre nas canções composta por aqueles que aqui vivem ou passaram. Da poesia de Fernando Brant “Nada existe como o azul sem manchas/Do céu do Planalto Central/E o horizonte imenso, aberto/ Sugerindo mil direções”, passando por Flávio Venturine, Renato Russo e vários artistas, como por exemplo, Natiruts: “Eu vou surfar no céu azul de nuvens doidas da capital do meu país…“. Independente da época e do estilo o céu candango sempre inspirou poesias. Mas, e o Rap?

Bem, o Rap nunca foi tão inspirado assim pelo azul celeste candango, como GOG  disparou em Brasília Periferia:

“Aqui a visão já não é tão bela”.

O Rap, em especial o feito no DF sempre foi bem realista e fez questão de mostrar que Brasília não foi feita para nós. Como assim para nós? Nós, nascidos ou migrados para o cerrado e amontoados nas Cidades Satélites (regiões que circunvizinham BSB) nunca tivemos espaço em Brasília. Sempre foi uma cidade para no máximo trabalhar. Há pessoas nascidas aqui que sequer tiveram oportunidade de conhecer os monumentos. Brasília nunca foi para nós, porém sempre fomos insistentes e “manchamos” a bela paisagem planejada com nossas roupas fora do padrão, nossa pobreza, nossos vícios, nossos riscos nos monumentos, nosso suor e pior, nosso sangue. Cabe a frase de Lucélia C. Fernandes:

“Olhei com tanto desanimo para os monumentos de Brasília e eles me devolveram o mesmo olhar desanimador”.

Por isso, esse fim de semana foi tão importante. O Rap já tem conseguido seus espaço no Plano Piloto, mas não a periferia. Isso, nas Asas ou próximo a elas têm se feito eventos com nossa música que não são para nós. Nada contra os que possuem maior poder aquisitivo curtir Rap, pelo contrário, consumam, pois é nosso sustento. Mas, os eventos feitos na maioria das vezes, com raríssimas exceções, são compostos de artistas do mainstream de fora, aos nossos rappers que ajudaram a criar o movimento no país, tem se reservado o afastamento, entretanto, desde o começo foi assim, não é de hoje que os rappers do DF tem dado o sangue para manter um cenário tão forte, portanto, a luta continua.

E o Periferia 360º realmente foi da periferia. Não apenas isso, foi ocupação, foi tomada de um espaço que é nosso por direito. O local escolhido foi o majestoso Museu Nacional da República e nada melhor que um museu para se fazer história. Há um bom tempo aquele local tem sido palco de resistência com a famosa Batalha do Museu e, agora foi tomado de vez.

Com palcos homenageando grandes lendas como “Palco Sabotage” e “Tenda Dj Celsão”, o Periferia 360º foi um evento democrático e para todos os gostos. No mesmo palco onde Guidart 121 e Código Penal representaram o mais puro Gangsta Rap, por exemplo, TheGust MC’s deu voz ao cenário emergente do underground sem decepcionar ninguém. Nomes históricos do Rap passaram por lá, como Dj Jamaika, Viela 17, GOG, Liberdade Condicional, Crônica Mendes e etc. Não citarei todos, pois a organização tratou de fazer um line-up espetacular.

Infelizmente a chuva estragou o fim da noite no primeiro dia, não tinha como o show continuar, pois era um risco à segurança dos artistas e público e assim aquele céu lindo que citei no começo, mostrou-se furioso e perdemos o show mais esperado: Mv Bill.

No domingo, além das atrações o festival contou com algo pesado: Smurphies Disco Club (cruel, muito cruel) comandada pelo Dj Markynhos. Se você não é de Brasília ou é e nunca curtiu um baile da Smurphies, é obrigatório conhecer! Igual um muçulmano precisa ir à Meca uma vez na vida, todo fã de Rap que pisa na terra sagrada do DF passa a ser obrigado a pelo menos uma vez na vida a ir em um baile da Smurphies, se não sua experiência terrena jamais estará completa. E sem medo da chuva o público lotou o local mais uma vez e foi à loucura com os shows do dia. Voz Sem Medo e Coktel Molotov foi um dos que quebraram tudo no domingão no “Palco Smurphies Disco Club”.

Enquanto isso no palco principal Maskavo fazia a cabeça e deixava a galera nas good vibes. Sem falar nas batalhas de rimas com grandes nomes das rinhas brasilienses e nos grupos de dança que se agitaram por lá.

Ao contrário do que se propaga por aí, São Paulo não é O BERÇO do Rap, é UM dos berços, pois ele também nasceu na mesma época nas ruas da Ceilândia. O Periferia 360º mostrou como esse movimento nascido nas nossas quebradas se tornou algo tão poderoso, bem estruturado e contundente. A periferia cresceu e aprendeu a fazer o melhor possível por ela mesma.

No aniversário do Hip-Hop posso dizer que foi uma festa digna da grandiosidade do movimento. Parafraseando um dos momentos mais arrepiantes do festival, quando Crônica Mendes entoou o hino nascido no A Família “Brinquedo Assassino”:

“Festival Periferia 360º não sai da minha mente”.

Confira o #vlog 03